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22 de agosto de 2009

Armadilhas da Vaidade - Sérgio Lopes

Dia desses fui cantar numa certa igreja e ao final do culto, fui levado até uma saleta onde seria servido um lanche. Num dado momento, o pastor que me recepcionava simpaticamente começou a me apresentar sua família. E dizia ele: essa aqui é minha esposa fulana, essa é minha filha sicrana, esse é meu filho beltrano e essa aqui é fulana, minha filha adotiva...
Ficaria tudo bem, se eu não tivesse percebido um brilho desaparecer dos olhos dessa adolescente, e seu sorriso, de radiante, tornar-se simplesmente constrangido.
Minha primeira vontade foi a de abraçar essa moça, numa tentativa talvez de suavizar-lhe o deslocamento pelo impacto negativo que aquela apresentação lhe causou. Mas refleti rapidamente e fingi que nem ouvi a discriminação, dedicando-lhe o mesmo sorriso e o mesmo aperto de mão que já havia dedicado aos seus irmãos. O meu abraço - naquele momento específico - também poderia tê-la feito sentir-se discriminada, pois ela perceberia ter sido tratada diferente dos outros. São armadilhas sutis de comportamento, que se a gente não estiver mesmo presente de espírito, a gente cai direitinho!
Fiquei refletindo depois, no carro, já voltando pra casa, sobre o motivo que leva alguns pais adotivos a fazerem essa distinção na apresentação dos adotados. Se deve haver um princípio de igualdade desfrutado pelos filhos, uma pessoa nunca deveria retirar uma criança de um orfanato se for usá-la sempre para fazer esse tipo de apresentação, que mais se parece com uma farisaica tentativa de informar ao mundo à sua volta que se praticou a boa ação de adotar uma criança. O que para esse pai ou mãe parece ser uma anunciação de bom caráter, para a criança soa na verdade como um convite ao constrangimento, pelo simples fato de que nenhuma criança se diverte sendo apresentada como “o estranho do ninho”. Como é difícil identificar as armadilhas da vaidade, não? Pois é... Se orienta, pai! Se liga, mãe!
Quando uma criança está num orfanato, ou numa FUNABEM dessas da vida, ela se sente, apesar de não ter um lar, irmanada a todas as crianças que estão à sua volta, e sente-se de alguma forma inserida num ambiente de igualdade que não é relativa, é REAL! Ela passa pelas mesmas dificuldades das outras, as mesmas desvantagens ou vantagens, com o mesmos direitos e deveres, e isso a torna aceita com integralidade naquele ambiente. Ali pode expor seus medos e inseguranças sem o fantasma da censura, pois, quem ali à sua volta não tem também medos e inseguranças?
No entanto, quando é adotada, a criança pretende finalmente elevar-se! Sentir-se segura e desfazer-se dos medos que antes possuía, desfrutando finalmente de uma família que resolveu absorvê-la como um membro natural. Quando isso não acontece, e aquilo que antes era um sonho de libertação se transforma em um grilhão de vergonha, ela sente-se inferiorizada, desclassificada e muitas vezes, desprezada. Todas essas frases melosas e aparentemente bem intencionadas que adjetivamos para distingui-las, como por exemplo “filhinho(a) adotivo(a), ou meu “filho-do-coração", são mórbidas e inconscientes tentativas de parecer ao próximo que somos bem-feitores, ou seja, algumas pessoas usam a adoção para passar à sociedade uma falsa idéia de que é solidário, mas quando usam essas classificações separadoras entre seus filhos naturais e os adotivos, fazem o adotado sentir saudade do convívio do orfanato, onde era igual a todos os outros. Então, senhores pais adotivos, não se deixem seduzir pela armadilha de querer parecer bom samaritano, e parem de apresentar de forma distinta seus filhos naturais dos adotivos, principalmente quando eles estiverem juntos. Lembrem-se que a esperança do adotado não é apenas ter uma comida melhor, brinquedos novos e boa escola, mas principalmente a esperança de sentirem-se FILHOS, sem nenhum adjetivo acrescentado a essa palavra. Não caiam na tentação da vaidade de parecerem justos ou bem-feitores da humanidade, mas apresentem seus filhos adotivos como apresentam os naturais, e vocês vão ver surgir um amor verdadeiro e incondicional entre essas crianças e vocês. Os filhos naturais não vão se sentir ultrajados, pois já sabem quem são, mas essa atitude fará uma incomensurável diferença no tipo de afeição que os adotivos passarão a ter por vocês. Não será uma afeição fingida, mas uma afeição CONQUISTADA.

Sergio Lopes

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